sábado, 16 de novembro de 2013

Phedre

Quelle plainte en ces lieux m'appelle...
Hippolyte n'est plus.
Il n'est plus, oh! Douleurs mortelle(...)

Os versos de Fedra de Racine de Rameau, que hoje sei seu sentido... O que queria com
súplicas desesperadas.
Finalmente o significado da morte de Fedra, o tenho.

Os deuses não a estavam punindo, estavam-na ao invés
libertando...

Fedra pede... alucinada, gritando, num desespero estonteante
"Ah! si vous êtes équitables,
ne tonnez pas encore sur moi.
La gloire d'un Héros que l'injustice opprime."

Fedra morre. Morre e se revela.
"Laissez-moi révéler à l'auteur de ses jour
et son innocence et mon crime."

Punição é pr'aqueles que ficam: ficam com sua história...
Os deuses congelam.
"Oh! Remmords superflus?
Hippolyte n'est plus."

Barulho

Tanto barulho por nada.
Nada. E o barulho que fazem.

Barulho, barulho, barulho. Só barulho, mais nada.
Barulho e passa. Silêncio.

Muito barulho e mais nada.
Depois do barulho, nada.

Salto ortonormal.

Tinha o salto alto e tinha o salto normal. O bolo diet e o bolo normal. O chocolate light e o chocolate normal. O top sundae e o sundae normal. A cobertura extra ou a cobertura normal. O apartamento (não a cobertura) grande e o apartamento normal. O cachorro manhoso e o cachorro normal. A personalidade problemática e a normal. A emblemática e a normal. A soturna e a normal... a sorridente e a normal.

Era normal.

E você, coca zero ou coca normal? Fanta, meu querido, é claro...

Porque sim... de perto, bem de perto o normal era pra dizer tudo aquilo que não era... Era um abuso de tudo que se queria contrapor apenas (e que, ao se contrapor ganhava a fama: normal) e não aceitava a diferença.

domingo, 25 de agosto de 2013

Experiências

Algumas experiências são deste tipo: não sei onde me começo e onde me termino. Em algumas experiências, uma subjetividade intensa nova violenta o corpo, rasga-o, o destrói, o corpo acostumado com o repousar em seu subjetivo. Entra à força, abrindo caminho qual animal selvagem no debandear da manada.  Que no fim se diz, alguma coisa ficou a mais em mim (e está independente da pergunta se gosto, se quero e o que é). Algumas experiências, aquelas em que ter controle de si sumiu.

Há neste momento algo em mim. Algo que, parece, terei de vomitar. Ou não sairá.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Seguidilha

Mas eu era mas eu era
o que não dissera:
revela-revela

chegoso' amor
da cor da dor

domingo, 4 de agosto de 2013

Sorteio das palavras

Jogo com começo-meio-fim. Truque na é sentido frase fazer. Palavras ordem sorteadas as são sem. Interpretar perde se se mas problema não há: sorteio é novo fazer um.

Amor

Visceral é o amor
certeiro no peito a faca crava
com força afunda recado à dor
o peito que se inocente era, deflorou

visceral é amar
amar sem amor pra
amar e se propor a amar
e se opor a mar
com fundo perdido
peito aberto ferido
esta imagem do outro, amar
amar-se sobretudo de espelho.
amar de mar balança em rebeldia
amor que é desobedecer.

Sou eu

Sou eu, o fracasso, bom dia. Um desajuste. Uma negação da inteligência. Sou o acontecimento obscuro, a face que não se quer mostrar, o que não se quer olhar. Há muita elegância em não se ser nada, repara. Há uma elegância irrestrita, que poucos atinge, a elegância do que é aparte. Do que não se integra. Mas se bem se pensa. Esta elegância é toda nossa. É tudo o que temos. De nos sentirmos fragmentados em pequenos pedacinhos incomunicáveis. Entre si e com os outros. Mas não era isso. Era o desajuste. Não há grande coisa em se sentir um desajuste. Em não fazer nada. Em não vencer na vida (como é que se vence na vida? Seria caso de ler verbete em dicionário: "vencer na vida"). Qualquer um faz isso em tentar não fazendo nada. Não faço nada. E não achei a elegância nisso. O truque é contudo tentar ansiosamente e falhar. Aí está.
Dizemos ainda, contudo... tentar e falhar, é fácil também qualquer um o faz.
Bom então a pequena elegância esteja em seguir tentando e falhando. Mas é coisa de quem está predisposto a respirar, seguir tentando. Oras. Me escapou a beleza... Porque acabo vendo que... naquilo que me era único, que eu era diferente... é o que todos somos iguais.

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Eu e você

Se meu pesar é o seu.
Se minha tristeza é a sua.
Se o meu maior choro é o seu.
E você continua
achando que somos diferentes?
E você continua
achando que estamos longe?

Se minha alegria é da sua.
Se minha vida é mera cópia da sua.
Se meu sentimento é o seu.
E você continua
achando que não me importo?
E você continua
achando que estou alheio e gosto?

Não é. É apenas diferente. Diferente
como eu não posso explicar.
Diferente como o caminho seguiu.

Mas...
se olha pra mim e vai chorar.
E eu não faço nada.
Repara.
É porque se destruiu o meu coração.
Não porque ele não está ali.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Dos gêneros

Imaginemos então que... não só o cristianismo, não só o platonismo, não só a aristotélica mas toda a teoria dos gêneros que herdamos até hoje, seja o resquício do socrático-platônico. Imaginemos que a divisão entre o masculino e o feminino, entre o bem e o mal, a verdade e a mentira, o ser e o não ser, são todos colocados em termos de ambivalências linguísticas. Porque o que não é masculino é feminino e vice-versa. O masculino e o feminino eram Deus e o Diabo (nesta ordem) e se consolidaram assim. Ou talvez, eram o que é bom e o que é mal (também nesta ordem), o que pecou e o que foi enganado pelo pecado. Pra ficar mais fácil, depositamos em qualquer uma destas categorias, toda a alegoria sentimental que tenhamos: ou é masculino ou é feminino. Toda representação de mundo que tenhamos: ou é masculino ou é feminino. Toda metáfora que exprima-se o corpo e para além dele: ou é masculino ou é feminino.

Qual é o sentido deste barulho que fazemos contra e a favor dos gêneros... Se, a bem da verdade, estes gêneros que estão aí colocados dicotomicamente, e que se impoem para modelar outros gêneros, são de fato ainda, o resultado de um pensamento único, um pensamento que nos prende há milênios, uma dicotomia sobre o discurso?

segunda-feira, 24 de junho de 2013

E se

você sair do armário baby... o mundo inadvertidamente te empurrará de volta pra lá em todas as situações em que você disser:"Oi, como vai?"

domingo, 23 de junho de 2013

Epifania da Picardia no Brasil

O maior e único homem rico, trilhonário, do mundo aparece na varanda de sua mansão. Concentrara toda riqueza, por assim dizer, desde que se tem notícia. Diz-se que mandou matar certa vez um reporter que lhe perguntou umas coisas obscenas. Dizia-se ainda que sua fortuna era capaz de cobrir uma cidade de ouro até a altura do himalaia.

Ao responder à pergunta, "mas o senhor não tem vergonha de deter toda riqueza do mundo, enquanto todo o resto morre na miséria completa?", afirmava o trilhonário:
- De maneira nenhuma. Esta pobreza já estava aí há séculos. E minha fortuna... eu a herdei de meus pais.

Uma pausa pra respirar e rematava com classe:

- E eles herdaram dos pais deles e estes por sua vez de seus pais...
E todos trabalharam muitissimamente pra conquistá-la.

segunda-feira, 6 de maio de 2013

Abramovic 2

Então é isso.

O encontro entre Marina Abramovic e Ulay, 20 anos depois é a explosão de uma supernova. O lugar em que tudo acontece e nada pode ser explicado, onde a linguagem se perde... é um exercício de absoluta presença. Presença nas sensações, dores, lembranças, momentos terríveis, presença na última caminhada. Presença num eterno, a presença no desistir de se encontrar a resposta.

É perfeitamente o desistir de se encontrar a resposta.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Espólio

Licença poética para dizer, sobrou um nada sobrou.
Licença poética para dizer que fomos um fomos nada.
Licença poética para dizer que juntos sonhamos nada.
Licença poética para dizer que desculpa pelo que sou nada.
Licença poética para dizer pela falta que me fez nada.

Peço licença poética finalmente para dizer ao senhor que todo meu sentimento, senhor doutor, foi um grande nada.

sábado, 16 de março de 2013

Uma volta

"Jogue a cópia da chave
Por debaixo da porta
Pra não ter motivos
Pra pensar numa volta...

Fique junto dos seus
Boa sorte
Adeus..."

Morri hoje quando li isso...

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Fazemos

Porque não importa o que você faz, no final, você sempre está sozinho. Independentemente de.

Marina Abramovic

Uma coisa assim, inexplicável. Passar a vida toda, uma eternidade inteira de cinco anos na confluência do ser junto com outra pessoa. Uma outra pessoa qualquer que está ali junto. Que com ela forma um já-não-sou-mais-eu-sou-outra-coisa-que-me-perdi.

Uma coisa, inexplicável. Não consigo pensar. Não consigo imaginar. Não consigo tatear, não consigo nada. Alguém me dá um verbo pra conseguir?

Inexplicável. Daí um dia, depois de muitos outros, depois que toda a subjetividade de um e dois foi destruída, um dia, eles pensam: não podemos mais... precisamos mais e mais que um e dois, precisamos outros mais que um e dois. Chegam à dolorosa conclusão de um. Dolorosa conclusão.

Claro. Com eles a coisa não iria ser assim, não iria ser a dolorosa conclusão e até logo. Havia um processo, havia algo, uma emergência, um chez bien.

Decidiram-se: cada qual a sua ponta na muralha da China, 5 mil quilômetros de distância aparte. 5000 quilômetros. São 5000000 de metros, 5000000000 de milímetros, 5000000000000 de micrômetros, podes imaginar o que caberia ali?

Cinco mil quilômetros de "não seis", 5 mil de "e o quês", 5 mil de um tudo.
Põem-se a caminhar. Um caminha daqui, outro já vindo de lá e tempo passado os dois estão a chegar no meio. Se encontram, se abraçam com toda profundidade que podem, com tudo que seu pouco corpo deixa, que sua pouca forma deixa, põem à prova naquele ato o seu nada existencial. Aproveita bem leitor, é o último. Desses não haverá mais, nem por séculos e séculos.

O Universo se abraça junto. E então. E então. Então adeus. Até logo não, não sei, nos veremos? Não sei, portanto não até logo, mas adeus.

Eis tudo.
Eis tudo.
Eis tudo.

O que quantificar, o que precisar, o que analisar, com o que ficar, o que descartar, o que demonstrar, o que escrever, o que levar, o que oq euq euq euq euq equequequeuqeqeqqqqqqqqqqqq.

Finalmente o Universo, que naquele momento se abraçado havia, entrelaçado seus infinitos braços, havia retalhado o tecido do espaço e do tempo, soltou-se por todo. Mas sim, demorou uma eternidade, diz-se que vários outros multiversos nasceram e morreram no meio do caminho.

Em tempo de humanos havíamos contado os quase 30 anos entre o Universo cruzar e descruzar os braços. Foi em 2010 que quando finalmente, sem poder se falar, sem poder exercer poderes sobre o outro (lembramos que o Universo relaxou nesta hora), eles batem os olhos um no outro, de novo um pouco por acaso, um pouco por não sabemos o quê.

Marina Abramovic no MoMA em Nova Iorque recebe Ulay. É o fechamento do suicídio de Virgínia Woolf a dizer: "Leonard. Always the years between us. Always the years. Always the love. The hours." Neste preciso momento, neste instante, neste infinitésimo, neste nada, neste grão de coisa nenhuma, neste átimo, as duas pontas do Universo se encontraram.

Ele sorriu satisfeito.

Bahia

Quando eu desci. No céu da Bahia de todos os santos. Vendo as praias deste lado e as praias daquele, a ponta da Barra. Olhei para o céu e deus me disse: vai!