domingo, 26 de julho de 2009

Onde a ferida dói.

Lá onde a ferida dói, lá é que Mara, o senhor das ilusões vai botar o dedo e cutucar. Lá onde ela dói. Mara, o senhor das ilusões, senhor da juventude eterna, pai da cosmética.

Estamos ficando eternamente jovens, eternamente adolescentes, estamos em frenesi pelo momento único da juventude. Eternos na juventude, sem rugas, sem problemas, juventude cheia de energia, que não sofre. Juventude com celulares, Ipods, orkuts, notebooks, juventude tecnológica, que não envelhece. Que se renova a cada 6 meses com a troca de velhos computadores por novos.

Uma juventude assim, como a de tudo que queremos... Mesmo quando adultos, quando 40, 50,60, 70 anos estamos eternos e jovens, pelo menos na mente, nós desejamos não ter mais que 20,30, desejamos alguém que não tem mais que 20, desejamos a mesma energia, e as baladas dos 20, desejamos a fonte que nos leve de volta ao que uma vez foi nosso. Uma vez.

Então, sim, eternos e jovens, celebramos, brindamos, Libiamo ne lieti calici che la beleza infiora, Godiamo la tazza e il cantico la notte abbella e il riso, in questo paradiso ne sopra il nuovo dì...

Il brindise.

A jóia que realiza os desejos. Mas os tempos não foram todos assim. Ó céus, eles não foram. Antes de termos a tecnologia e os psicanalistas para suporte emocional ao desgaste tecnológico, antes de termos que trocar de celulares a cada ano, computadores a cada seis meses, novas tecnologias de som a cada 2 anos, e um monte de micro aparelhos, utilíssimos, tínhamos que. Não tínhamos que nada, porque não tínhamos dinheiro, nem o que comer. Os tempos não foram sempre assim, não.

E antes disso, antes, o que havia? Se escreveu já que uma molécula disse sim a outra e a vida começou, o que foi uma espécie de prova de que as coisas começaram com um sim. É difícil ponderar o que houve um pouquinho antes disso, já que mesmo depois não sabemos.
Ao mistério das relações, se decreta ser inominável.
Na verdade: aquilo que não quer ser chamado.

Bebamos e brindemos à que o tempo nos devolva o paraíso. 

Onde vamos acabar. Nós já acabamos, nas lojas de cosméticos, na cirurgias plásticas, na ginástica, na musculação, já acabamos, no imaginário dos pintores.

Há pintores ainda vivos? Há poetas? Escritores? Esse nicho de gente que não se sabe o que fazem, mas que tentam reavaliar a loucura das pessoas. Ninguém se engane, depois de Freud, tudo isto ficou a cargo da "ciência da psicanálise" que agora se apoderou também do destino do nosso inconsciente, a última parte que era só nossa. Lá onde a gente podia esconder as coisas que ninguém queria saber: medo, fobia, feiurinha, sofro, não sofro?

Sofrer? A última sensação assim foi há dois séculos e meio, quando a pílula anti-sofrimento tinha menos de 10 anos de inventamento.
Se as pessoas morrem? Sim, elas morrem, mas só por um processo inevitável, de renovação, as novas gerações EXIGIRAM que os velhos morressem e fossem substituídos por unidades carbônicas novas, afinal já estavam aí tomando espaço há muito tempo. A partir daí se estabeleceu uma idade limite sabe. Não que não se possa passar dela, mas note-se que aí é preciso de alguns artifícios ardilosos.

Também não fosse assim, e pensamos, numa progressão sempre crescente do número de pessoas e em poucos anos a massa crítica se atingiria, o Governo precisaria intervir em nome da moral de dos bons costumes, pra garantir o bom convívio da população.

A morte tem que estar aí não sabe? A medicina quer criar uma pessoinha com genes inquebrantáveis, validade (e vaidade) pra sempre, só que a morte tem que estar aí...Se a morte sair de férias, oras! Se a morte sair de férias, já tivemos exemplos negativos bastante naquele livro do Saramago, mas depois ela se arrependeu e voltou. Sim, é claro que, se chegarmos a demitir a morte de seu cargo, darmo-lhe a carta das euforrias, o Governo daria um jeito de fazer a coisa funcionar no submundo (me perdoem os plágios).

Porque sim. O que os Governos fazem. O que as morais acertam, os bons cotumes, o bem dos cidadãos. O que o bem de todos os cidadãos pede pra que os governos façam, eles fazem, eles fazem exatamente como queiramos que seja feito. E não tenho dúvida nenhuma que tenha sido assim desde o começo, que a frase "cada povo tem o Governo que merece" é uma grande tolice, afinal ninguém merece Governo nenhum, apenas este é a representação máxima de um poder de pensamento e ações públicos.

E isto é a coisa mais imoral e mais suja que este lugar podia receber... todos estes anseios que precisam ser assegurados a todos os cutsos. 

Brindise: os continuamos assegurando. In questo paradiso ne sopra il nuovo dì.

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