quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Haja sexualidade

E depois eu andei pensando como o Caio Fernando, o que mais há pra se dizer sobre os gays.
Andei pensando dolorosamente sobre a adolescência gay, o quanto é um período conturbado. Bom, adolescência é sempre complicada. Já toquei brevemente no assunto num tópico lá atrás "Uma Ferida Aberta".

Sim, toda adolescência é um período difícil, frase mais batida não há. Mas vamos colocar um ingrediente a mais de complicação, o adolescente filho da classe média é gay. Ah bom, aí fica meio que um samba do balangandan. Não estou autorizado pela consciência a falar da adolescência gay nas "classes ricas" (e pouco das pobres). Pelo simples fato de que não vivi e de que não tive nenhuma experiência com isto.
Entre os pobres, o pouco que eu fiquei sabendo de amigos... é parecido. Como não tenho amigos ricos, esta parte ficará pra quando não sei. (E é uma coisa impressionante, as histórias de gays adolescentes, ou jovens que saem do armário para seus pais, como é parecida).

Como um filho gay de pais de classe média sempre soube que, o desejo dos pais da classe média é o casamento de seus filhos. Se o filho for homem, ele tem que ser um macho, provedor-reprodutor. A família tem que se assegurar, de que o machinho, novo no rebanho, consiga angariar para si, e para a moral, sempre novas cocotas, de preferência altas e independentes. (Pelo menos que assim se pareçam...)

Se a filha for mulher ela tem a opção forçada de início à vida sexual mais tarde, é claro, não queremos afinal nossas honras lavadas. Se isto parece manjado, ainda dita por aí as leis faladas e silenciadas de um sem-número de famílias, acreditem...

Aí sorrateiramente, como que dando uma rasteira nos pais, os filhos aparecem com um "sou gay", sou bicha, maricas, viado, gosto de dar ré no kibe, (ou diriam os mais sensíveis: sou diferente...) ou ainda com um "sou lésbica", sapa, calço 47, colo o velcro, ou as mais sensíveis, sou uma menina que gosta de meninas. (A diferença entre o que é a sensibilidade masculina e a feminina, notória: a homossexualidade masculina é mais impronunciável que a feminina mas não esperávamos diferente em uma sociedade falo-centrada).

As reações, bem adversas, vão de socos e pontapés, a botar fora de casa, a choro, a onde foi que eu (nós) errei(amos), a estou sentindo uma dor forte no peito. Há pais que enfartam (sim, história confirmada em primeira pessoa). 

Pra mim, gostaria de alguma coisa à Carmen, no último ato, depois do, Sou gay..., És gay? 
"Ui, cest moi(...) laisse moi passez!"

(o coro, óbvio, acompanharia com o "Victoire, Bravo!", saudando o toureiro...)

Acho que a melhor forma de contar teria que ser alguma coisa do gênero "pai, mãe, sou gay, agora vou me jogar no fogo ali, pra lavar a honra da família..." ou como fez um antigo conhecido: "pai, mãe, sou gay, e estou me expulsando de casa..." (pra evitar futuros danos mútuos, é CLARO)...

Mas sim, sempre se pode esperar a simpatia, ou as reações inusitadas, mas bonitas... Disse um amigo meu pra sua irmã (cujos nomes não cito por óbvio), "Sonia, eu sou gay...Nossaaaa Diego! Eu sabia que você era sensível, mas não sabia que era tanto!".
Infelizmente se trata de uma minoria.

Passado o choque, vamos às administrações dos efeitos colaterais. No caso de expulsão, eu não sei o que há para administrar, é fato, como se administra os pais que além da reação chauvinista, ainda expulsam os filhos da casa. Ah bem, no meu conceito, cadeia é um lugar bem novo e esclarecedor. Mas não me julguem, não é nada, a não ser um bom presente à sua bondade receptiva para boa nova.

Se a reação foi um pouco menor, vão ficar em maior ou menor grau sempre algumas frases de conteúdo interessante. "Eu não entendo você ser gay... não entendo gostar de homens, não entra na minha cabeça como um homem pode deitar com outro."
Esta é a primeira delas. De minha parte, eu não entendo não entender. E não se tratando de culpas, de um não entender o outro, cito apenas que há uma relação vertical: se você não não-me entende, eu não não-te entenderei. Conseqüentes. Portanto, se deixardes o teu não me entender, por conseqüência, o meu se desatará no ato... Entretanto, se insistes, não há o que eu possa fazer.

Outra chave mestra do depois da armadilha que os filhos, estes pirralhos mimados com suas novas modas (e agora ainda Emos!), nos trancaram é "a sua situação" (acho que já deu pra perceber que eu adoro o light motif "o inominável". Foi bem dito por Wilde há muito tempo, como o "amor que não ousa dizer o nome". Pelos vistos ele continua emudecido, e agora fazendo questão de se esconder). "A sua situação", deve sem dúvida se referir ao meu desemprego temporário. (Eu jamais pensei que se refiriria a eu ser gay, se alguém pensou).

Uma outra chamada interessantíssima é o "não conte pra ninguém". Ai de mim, contar pra alguém que sou gay. Nunca isso passou pela minha cabeça! Vou esconder sempre a sete chaves, embaixo da minha pele aqui, esta coisa tão horrorosa que é, ser gay.
"Mas eu só quero te proteger." 
(De seu egoísmo e chauvinismo?).

Finalmente uma pedra preciosa também é a "tudo bem, mas não traga seus amigos gays e/ou namorados(as) aqui em casa, não nos obrigue a passar por MAIS esta humilhação..."
Adoro essa. É como "ah você é gay? Pois então faça-me o favor de virar uma caixinha de alguns centímetros, e posar como motivo de decoração da sala (não esqueça os laços)".

Há uma série de variações a estes temas acima, e algumas outras que desconheço, porque a loucura é a maior de todas as criatividades e sempre encontra novos caminhos pra se apresentar entre públicos refinados.

Mas é claro. Seria esdrúxulo não considerar o sentimento dos pais. Não considerar que sim, pra eles também é difícil aceitar filhos gays (oras, pros filhos, gays, também esta aceitação em geral não é imediata). 
E o porque destas descrições precisas? Porque a parte a estes sentimentos pré-preparados que vêm longa data, desde a sociedade cristã, da "culpa dos gays em o serem", estes que queiramos ou não teremos de lidar, a parte a isso, precisamos, hoje ou amanhã, dissolver um pouco da auto-hipocrisia, e do sentimento conivente com o preconceito, por indulgência... (Conivência essa, bom que se note, que eu também passei, e fui abdicando, em favor do bem-social).
Infelizmente... uma libertação apenas não basta.

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